Número de SÉRIES: 'Para o Alto e Além'?
- Blog Prof. Wellington Lunz

- 6 de out. de 2023
- 7 min de leitura
Atualizado: há 6 horas
Resumo: um estudo inédito testou o maior volume semanal de séries já feito por uma pesquisa científica. O estudo comparou três grupos (22, 42 e 52 séries/semana) em homens bem treinados por 12 semanas. Para hipertrofia muscular, não houve diferença estatística entre os grupos, embora com tendência favorável para os grupos de 42 e 52 séries. Uma hipótese pessoal é que 52 séries poderia até ser até prejudicial, mas não foi o caso. Uma análise mais cuidadosa permite interpretar que o volume deve ser ajustado individualmente.

Prof. Dr. Wellington Lunz - Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Mas, em 2024, foi publicado um estudo (Effects of Different Weekly Set Progressions on Muscular Adaptations in Trained Males: Is there a Dose-Response Effect?) com o MAIOR número de SÉRIES semanais já administradas num estudo científico (chegaram a 52 séries semanais).
Então merece um post específico. O estudo foi muito bem desenhado e bem conduzido. De forma randômica os pesquisadores formaram 3 GRUPOS experimentais, envolvendo pessoas com >2 anos de experiência (média 5,1 anos) em treinamento de força.
GC (n=13), 4SG (n=12) e 6SG (n=12)
O grupo controle (GC) fez sempre 22 séries durante as 12 semanas de intervenção. E os grupos 4SG e 6SG aumentavam 4 e 6 séries, respectivamente, a cada 2 semanas.
No final do estudo, os grupos GC, 4SG e 6SG faziam 22, 42 e 52 séries semanais.
A carga foi modulada para manter as faixas de reps (6-8 e 10-12 reps). As séries foram feitas com ~2 reps de reserva, exceto a última de cada exercício, feita até a falha. Sobre 'reps de reserva' e 'falha muscular', leia depois meu post: Falha Muscular Para Quê? Entenda a Ciência da ‘Falha Muscular’.
O treinamento de força era de 2 x/semana, com 3 exercícios para quadríceps (agachamento costas, leg press 45 graus e extensão de joelho). Houve também exercícios para os posteriores de coxa.
Talvez a maioria desconheça essa importância, mas vale destacar que o tamanho amostral foi calculado considerando poder estatístico de 0,80 (erro beta máximo de 20%).
Isso diminui muito a chance de um resultado estatisticamente ‘não significativo’ ser causado pelo pequeno tamanho amostral. Dizendo de outro jeito: A amostra foi boa, e até superior ao mínimo. Essas nuances científcas eu explico com calma no meu livro (falarei dele no final).
Os critérios de inclusão e exclusão foram exigentes: não uso de creatina nos 6 meses anteriores; não uso de anabólicos e anti-inflamatórios; experiência >2 anos consecutivos de treino de força; fazer agachamento com >1,5 vezes o peso corporal; completar ≥90% das sessões de treino supervisionado.
E outras questões metodológicas que merecem relevo: houve registro alimentar feito por nutricionista ‘cegado’ em relação aos grupos (ou seja, não sabia a qual grupo cada participante pertencia).
A espessura muscular do vasto lateral foi analisada em 30% (proximal; mais próximo do quadril), 50% (medial) e 70% (distal) do comprimento do fêmur, usando ultrassom modo-B, feito por um técnico também ‘cegado’ em relação a alocação do grupo.
E como a medida foi feita, também é importante, pois usaram uma estratégia que aumenta a correlação com a ressonância magnética. Sobre melhores medidas de massa muscular e melhores estratégias, leia meu post Como Medir Massa Muscular? Há jeito fácil e confiável.
Agora, vamos aos RESULTADOS:
Para FORÇA máxima, no agachamento, os grupos 4SG e 6SG exibiram melhora quando comparado ao GC.
Veja as médias e intervalo de confiança 95% (IC95%) (em kg): GC = 11,8 [8,6 a 14,9]; 4SG = 18,0 [14,8 a 21,3], 6SG = 26,3 [23,2 a 29,3].
Em relação a HIPERTROFIA do vasto lateral, todos os grupos tiveram ganho, mas NÃO houve interações SIGNIFICATIVAS entre os grupos (p ~ 0,07).
Veja as médias e IC95% para área muscular (em cm2): GC = 1,6 [0,6 a 2,5]; 4SG = 3,8 [2,7 a 5,2]; 6SG = 4,3 [1,8 a 6].
E para a espessura muscular foi (cm): CG = 0,40 [-0,04 a 0,84], 4SG = 0,72 [0,29 a 1,16], 6SG = 1,06 [0,65 a 1,48].
Avaliando as médias e o valor de p (~ 0,07), percebe-se uma TENDÊNCIA a favor dos grupos 4SG e 6SG (mas não entre esses 2 grupos).
Mas aqui entra a história da importância do PODER ESTATÍSTICO. Se a amostra fosse insuficiente, daria para especular algo como: ‘Se a amostra fosse maior, poderia ter dado diferença’.
Ou seja, apesar das médias favoráveis aos grupos 4SG e 6SG, não dá para garantir que se o experimento for repetido várias vezes tais MÉDIAS irão se repetir.
Veja o caso da área muscular: o IC95% sugere que caso se repita o experimento várias vezes, participantes do 6SG poderiam (no âmbito da probabilidade) ganhar tão pouco quanto 1,8 cm2, e participantes do GC tanto quanto 2,5 cm2.
Os autores inclusive comentam na discussão que um participante do grupo 6SG teve perda de área transversa. Por isso que não se pode TORTURAR os resultados estatísticos em prol de desejos pessoais.
Se você tiver os seguintes PENSAMENTOS:
“Tenho tempo de sobra pra ficar na academia” (os grupos 4SG e 6SG demandaram ~100 min por sessão, e o grupo GC apenas 50 min);
“Tenho motivação suficiente para aumentar e manter o volume alto”;
“Como possivelmente não terei prejuízo, a simples chance de ganhar um pouco mais já me satisfaz”;
“Não me importo com a incerteza do que ocorrerá após 12 semanas de treino” (alguns participantes do grupo 6SG relataram fadiga excessiva nas semanas finais da intervenção).
Então, você poderia SIM fazer até 42 a 52 séries. Mas...
Lembre-se que o aumento do volume foi progressivo, e não imediato. Aliás, a média e mediana de séries durante o treinamento foi de 22, 32 e 37 séries para os grupos GC, 4SG e 6SG.
E diferente de estudos anteriores, que treinaram até a falha, esse estudo aqui só permitia a falha na última série.
Ou seja, talvez fazer 52 séries sempre até a falha possa já cair no cenário de prejuízo (claro, precisamos de estudos para confirmar).
Destaco tais coisas para lembrar que se você for fazer tal protocolo, faça como foi feito no estudo. E é IMPORTANTE reiterar que eram pessoas bastante treinadas (média 5 anos) e que foi apenas para membros inferiores, variando exercícios (variar exercícios é diferente de treinar só um).
Em resumo, um belo estudo, publicado numa ótima revista, e que nos permite inferir que o platô para HIPERTROFIA muscular parece estar em torno de 42 séries, e que mesmo até 52 séries semanais não parece gerar prejuízo (mas também não seria eficiente...depois leia meu post Como Treinar Com Eficiência? Treinar Muito Não É Treinar Certo).
E, baseado em experiências, eu teorizei que talvez começássemos a ter perda de massa muscular depois de ~45 séries semanais. Considerei treinos até a falha muscular.
Mas o presente estudo mostrou que até 52 séries NÃO gerou prejuízo na massa muscular. Mas, se o treino continuar desse jeito, não há qualquer garantia. Lembre-se que o estudo durou apenas 12 semanas.
Mas tudo isso nos deixa as seguintes questões: Qual é o limite? Quando ocorrerão perdas?
Registro que a única pessoa que teve perda de área muscular foi do grupo 6SG, o que sugere que o limite pode estar perto disso.
Mas o que mais me surpreendeu no estudo foram os resultados para FORÇA máxima.
A minha interpretação é que o volume para força poderia ser menor que para hipertrofia, conforme a literatura que tenho acompanhado.
Mas não foi isso que os autores viram. Até 52 séries semanais continuou gerando ganhos de força. E foram expressivos considerando pessoas bastante treinadas. Esse é um resultado intrigante, e que os treinadores devem debater com seus atletas.
Concluindo: em especial para você que sentiu alguma dificuldade de entender minhas falas estatísticas e científicas, e que, além disso, deseja aprender a julgar a qualidade metodológica de artigos científicos e a força da recomendação dos resultados, adquira meu livro:
Em tempos de desinformação massiva e de tantos falsos experts, distinguir evidências reais das falsas é tanto emancipador quanto vital. Esse livro ensina a julgar a qualidade da evidência e a força da recomendação de qualquer artigo científico da área da saúde.
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E se você quiser ver o uso prático, passo a passo, da aplicação do meu livro, acesse o post: Polilaminina: NÃO há Evidência de Cura de Paraplégicos ou Tetraplégicos.
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Autor: Wellington Lunz é o proprietário desse Blog e do site www.wellingtonlunz.com.br. É bacharel e licenciado em Educação Física, Mestre em Ciência da Nutrição e Doutor em Ciências Fisiológicas. Professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) desde 2009.




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