Sarcopenia: Tudo Que Você Precisa Saber
- Blog Prof. Wellington Lunz

- 23 de mar. de 2021
- 6 min de leitura
Atualizado: há 2 dias
Resumo: a sarcopenia é uma síndrome multifatorial, caracterizada pela perda de massa, força e funcionalidade. Ou seja, não é somente perda de músculo. E o envelhecimento gera mais perda de força e potência que de massa muscular. A dinapenia (perda de força) pode surgir a partir dos 40 anos, e acelera após os 70. Isso é preocupante, porque a força está diretamente ligada à autonomia funcional — idosos podem precisar usar até 90% da força máxima para tarefas simples. Nenhum medicamento substitui o treinamento de força e potência na tarefa de frear essas perdas. E é preciso ter cuidado, pois a aparência física não reflete a funcionalidade da pessoa idosa.

Prof. Dr. Wellington Lunz - Universidade Federal do Espírito Santo
O envelhecimento inevitavelmente induz, ainda que possamos desacelerar (veja nesse post aqui), muitas perdas orgânicas.
Certamente é possível escrever vários livros sobre as muitas perdas em cada sistema orgânico (ex: pele, cardiovascular, muscular, ósseo, endócrino, etc.).
Mas para não deixar você apenas com informações gerais, vou dar alguns exemplos:
>> Diminuição da capacidade neural (tanto cognitiva quanto motora).
>> Enrijecimento vascular (favorecendo o aumento da pressão sanguínea).
>> Aumento de fibrose muscular (incluindo no miocárdio).
>> Aumento de gordura intra e intermuscular.
>> Inflamação crônica.
>> Diminuição da elasticidade e do tamanho pulmonar.
>> Perda óssea.
>> Prejuízos posturais que podem causar problemas funcionais (ex: dificuldades respiratórias). Há um post bem interessante aqui sobre como avaliar a capacidade funcional de pessoas mais velhas.
>> Diminuição e alterações hormonais.
>> Aparecimento de doenças crônicas (ex: diabetes, doenças cardiovasculares, cânceres, etc).
Nos âmbitos muscular e neuromuscular podemos descrever as seguintes alterações:
>> Atrofia e perda de fibras musculares (principalmente de fibras do tipo 2).
>> Agrupamento de fibras (principalmente do tipo 1).
>> Redução de unidades motoras rápidas. Por exemplo, uma pessoa de 80 anos pode ter 50% menos fibras e unidades motoras do tipo II, e até 70% menos força que um jovem.
>> Infiltração de gordura intermuscular.
>> Prejuízos neuromusculares.
>> Perda de força e potência muscular (refs. Snijders et al.; 2020; Fleck e Kraemer, 2017; Delmonico e Beck, 2016).
E por aí vai... Mas minha intenção aqui não é focarmos no problema, mas sim na compreensão do fenômeno para podermos focar naquilo que temos poder de ação. Se o que descrevi acima desanima, vale a pena ler meu post 'Envelhecimento Biológico: O Treinamento Físico Pode Combater?' para reanimá-lo/a.
Vou me ater principalmente a SARCOPENIA. Ou seja, focarei nas alterações relacionadas ao músculo esquelético e integração neuromuscular.

A palavra sarcopenia vem do Grego, e seu significado original é “pobreza da carne”.
Embora a sarcopenia foi considerada por bastante tempo apenas como perda de massa muscular, atualmente seu conceito é mais amplo.
Trata-se de uma síndrome geriátrica multifatorial, que envolve perdas de massa muscular, força e capacidade funcional (Delmonico e Beck, 2016).
A sarcopenia é uma das causas da dinapenia, que se refere a perda de força muscular induzida pelo envelhecimento, e tem seu início aproximadamente aos 40 anos (mas pode variar bastante).
Mas a dinapenia tem múltiplos fatores causais, com destaque aos prejuízos relacionados a integração neuromuscular.
Quando fazemos uma linha de tendência dos 30 aos 50 anos, a perda de força não é tão grande. Se fizermos essa linha dos 40 aos 60 anos, essa perda será maior que a anterior. Mas, de modo geral, depois dos 70 anos é que a luz fica vermelha.
Depois dos 70 anos a perda de força se acelera muito. Há estudo que registrou perda de 16% de torque (medida de força) nos músculos extensores do joelho em apenas 5 anos de envelhecimento (entre os 70 anos e 79 anos).
Nesse mesmo intervalo de tempo a perda de massa muscular foi bem menor (~ 5%) (Delmonico e Beck, 2016).
E como é a força muscular que está associada a funcionalidade física, isso preocupa muito.
Por exemplo, uma pessoa idosa pode precisar de aproximadamente 90% da força máxima dos extensores do joelho para levantar-se de uma cadeira, enquanto uma pessoa jovem pode não precisar sequer de 50% da sua máxima força.
Outra variável associada a funcionalidade física é a potência muscular (força x velocidade), e sua perda é ainda mais acelerada que a força (Fleck e Kraemer, 2017).
A qualidade muscular também reduz muito. Qualidade muscular refere-se a produção de força gerada por uma dada área ou volume de músculo (Delmonico e Beck, 2016).
Para ser didático, se uma pessoa de 70 anos tiver ‘x’ de volume muscular, e uma pessoa de 20 anos tiver esse mesmo ‘x’ de volume muscular, essa pessoa jovem produzirá mais força que a mais velha.
A sarcopenia deixou de ser apenas compreendida somente como perda muscular exatamente porque a perda de força e potência são maiores que a massa muscular.
E a associação entre massa muscular vs. funcionalidade é menor que a associação entre força ou potência muscular vs. funcionalidade.
O diagnóstico da sarcopenia é feito considerando três variáveis:
>> Volume de massa muscular
>> Força muscular
>> Capacidade funcional
Aliás, há uma gradação para sarcopenia: Pré-sarcopenia, Sarcopenia e Sarcopenia Severa (Delmonico e Beck, 2016).
No âmbito clínico, referente a diagnóstico, é comum o uso do hand-grip para estimar a força. Para avaliação do volume de massa muscular o ideal é a ressonância magnética ou tomografia computadorizada, tendo a bioimpedância como alternativa menos cara (mas, também, menos precisa).
A avaliação da funcionalidade é algo particularmente decisivo. E recomendo a leitura do meu post Quais os Testes para Avaliação Funcional de Idosos?
Para concluir, devemos sair dessa leitura com as seguintes interpretações:
>> Sarcopenia não é apenas perda de massa muscular.
>> Dinapenia não é causada apenas por perda de massa muscular.
>> Temos que frear a perda de força e potência utilizando treinamento de força e potência (não há remédio que substituia o treinamento físico de força), pois do contrário perderemos função.
E sobre isso recomendo meus posts:
>> A massa muscular, seja medida ou "visual", não deve ser usada para interpretar a capacidade funcional de idosos. Isso é tão impactante que destacarei um alerta aqui:
“É muito comum que as pessoas julguem seus entes mais velhos como ‘fortes’, ‘saudáveis’ ou ‘ativos’ apenas pela aparência da composição corporal ou por funções motoras de menor complexidade (ex: caminhar, cozinhar, passar roupa).
Entretanto, não raro, quando fazemos testes funcionais, essas pessoas mais velhas mostram desempenhos muito ruins. Quando aumentamos a complexidade da tarefa (ex: deitar e levantar do solo, deslocamentos, levantar de um sofá baixo) essas pessoas não conseguem ir bem.
Detalhe: Uma pessoa pode ser obesa e sarcopênica ao mesmo tempo (Delmonico e Beck, 2016).
Essas coisas preocupam muito, pois a perda de competência funcional está muito associada a quedas e fraturas, as quais podem condenar a pessoa idosa à morte, uma vez que a recuperação é muito difícil em pessoas mais velhas”
E aproveito para divulgar meu livro Tomada de Decisão Baseada em Evidência: como julgar o nível de confiança e o grau de recomendação de artigos científicos na área das ciências da saúde.
Em tempos de desinformação massiva e de tantos falsos experts, distinguir evidências reais das falsas é tanto emancipador quanto vital. Esse livro ensina a julgar a qualidade da evidência e a força da recomendação de qualquer artigo científico da área da saúde.
O livro oferece um sistema estruturado e didático, com:

Modelo de Julgamento: um sistema quantitativo de notas (0 a 100%) em paralelo a um sistema qualitativo (muito baixo, baixo, moderado, alto e muito alto).
Separação Estruturada: um framework claro para avaliar o nível de evidência com base em 13 quesitos metodológicos, e o grau de recomendação com base em 9 quesitos formais.
Ferramenta Prática (Checklist/Planilha): O conteúdo está associado a uma planilha gratuita que orienta no julgamento da qualidade da evidência e na força da recomendação (e ainda serve como checklist).
Script para Inteligência Artificial: fiz um script para a IA ChatGPT poder julgar o nível de evidência e o grau de recomendação. Embora a IA não deva substituir o julgamento humano final, ela facilita a compreensão e diminui a chance de erro humano, pois o script foi projetada para que a IA explique a razão das notas dadas a cada quesito.
E se você quiser ver o uso prático, passo a passo, da aplicação do meu livro, acesse o post: Polilaminina: NÃO há Evidência de Cura de Paraplégicos ou Tetraplégicos.
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Até o próximo post!
Treinamento de força reduz o risco de doenças cardiovasculares? Ou é coisa para o exercício aeróbio?
Autor: Wellington Lunz é o proprietário desse Blog e do site www.wellingtonlunz.com.br. É bacharel e licenciado em Educação Física, Mestre em Ciência da Nutrição e Doutor em Ciências Fisiológicas. Atualmente é Professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).




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