NÃO há Evidências de Que ESTRESSE METABÓLICO Induz Hipertrofia
- Blog Prof. Wellington Lunz
- 25 de mai. de 2022
- 4 min de leitura
Atualizado: há 4 dias
Resumo: Há pelo menos 4 argumentos científicos contra a ideia de que o estresse metabólico seja um sinalizador direto da hipertrofia: (1) a hipóxia isolada, típica do treino com oclusão vascular, não causa hipertrofia; (2) o aumento do uso de ATP, típico de treinos metabólicos, ativa a AMPK, a qual inibindo a síntese proteica; (3) radicais livres resultantes de treinos metabólicos não explicam hipertrofia; (4) o lactato estimula o crescimento in vitro, mas não há evidência que exista qualquer sensor de lactato associado à hipertrofia in vivo. A hipertrofia atribuída ao estresse metabólico parece, na verdade, resultado do próprio estresse tensional.

Prof. Dr. Wellington Lunz - Universidade Federal do Espírito Santo
A suposta hipertrofia muscular induzida por estresse metabólico pode, na verdade, estar encobrindo a hipertrofia muscular induzida por estresse tensional.
Não parece haver dúvida de que o estresse tensional explique os ganhos de massa muscular, como mostrei no post: Estresse Tensional ou Mecânico Causa Hipertrofia Muscular?
Há pelo menos 4 argumentos que pesam contra a tese do estresse metabólico como sinalizador da hipertrofia muscular. Vamos a eles:
1 A hipóxia/isquemia, que é típica da oclusão vascular, não causa hipertrofia muscular quando dissociado do exercício de força (Takarada et al., 2004). Até já vi estudo sugerindo alguma hipertrofia, mas passa muito longe de explicar a hipertrofia que alcançamos com exercício de força.
Além disso, o exercício de força com 'carga leve + oclusão vascular' gera um padrão de recrutamento de unidades motoras com inclinação (slope) mais rápida e com maior frequência de disparo neural do que o exercício de força sem oclusão vascular (Wernbom e Aagaard, 2020).
Traduzindo: isso equivale a dizer que o estresse metabólico contribui para aumentar o NÚMERO de células musculares trabalhando, e para que essas células musculares trabalhem MAIS.
Nesse sentido, o efeito do estresse metabólico para hipertrofia muscular parece indireto, e não via cascatas hipertróficas ativadas diretamente. Sobre os mecanismos moleculares da hipertrofia, indico meu post: Quais os Mecanismos da Hipertrofia Muscular?
Talvez você esteja perguntando: Como a oclusão vascular, durante o exercício de força, contribui para aumentar o recrutamento de unidades motoras?
Veja: o exercício de força concomitante a oclusão vascular induz acúmulo de metabólitos. Isso estimula metaborrecepetores e aferências nervosas do grupo III e IV. Sabe-se que essas duas vias são importantes para o sistema neuromotor recrutar mais unidades motoras (Attwaters e Hughes, 2021).
2 A ativação muscular aumenta em até 100 vezes a taxa de uso de ATP. Isso, por sua vez, aumenta a concentração de ADP, que, em parte, será convertido em AMP pela via adenilato quinase (assim: 2ADP ↔ ATP + AMP).
Por sua vez, AMP ativa a AMP quinase (AMPK), a qual é INIBIDORA da síntese proteica (ex: inibe a mTOR e o fator eEF2, que regula a taxa de tradução ribossomal).
A AMPK age para poupar energia, e diminuir o crescimento é um caminho para isso. Por isso a AMPK é chamada de 'enzima conservadora de energia' (Attwaters e Hughes, 2021).
Ou seja, fica difícil associar a redução de ATP ou aumento de ADP (que são característicos do estresse metabólico) à hipertrofia muscular.
E é importante lembrar que exercícios leves e volumosos, os quais são mais metabólicos, não são nada inofensivos. O catabolismo pode ser bastante grande, a ponto de ser inclusive perigoso (ex: rabdomiólise). Depois leia meus posts:
3 Alguns acreditam que radicais livres gerados pelo estresse metabólico seriam a explicação. Mas, em humanos, a suplementação com antioxidante NÃO impede a hipertrofia muscular (Attwaters e Hughes, 2021).
4 O lactato é o mais promissor dos mecanismos sugeridos. In vitro é capaz de sinalizar para a TORC1, estimular a diferenciação de mioblastos, estimular hipertrofia celular e aumentar a regeneração.
Contra o lactato pesa o fato de não se conhecer qualquer 'sensor' de lactato associado à hipertrofia muscular. Se quiser conhecer os sensores conhecidos, leia depois o post: Quais os Mecanismos da Hipertrofia Muscular? Conheça a Função dos Mecanossensores.
Isso tem feito cientistas desconfiarem que o efeito do lactato seja indireto. Como o lactato pode ser usado para gerar ATP, isso aumentaria a razão ATP:AMP, que é uma condição pró-crescimento celular (Attwaters e Hughes, 2021).
Concluindo: faltam evidências a favor do estresse metabólico como sinalizador direto de cascatas hipertróficas.
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Até o próximo post!

Autor: Wellington Lunz é o proprietário desse Blog e do site www.wellingtonlunz.com.br. É bacharel e licenciado em Educação Física, Mestre em Ciência da Nutrição e Doutor em Ciências Fisiológicas. Professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) desde 2009.
