A Pirâmide (mumificada) das Evidências Científicas
- Blog Prof. Wellington Lunz
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Prof. Dr. Wellington Lunz
Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
A Tomada de Decisão Baseada em Evidência (TDBE) é um princípio fundamental na ciência e na prática intervencional.
Obviamente, um dos elementos mais importantes é o ‘nível da evidência científica’.
Foi nesse contexto que a ‘Pirâmide das Evidências Científicas’ foi proposta.
Mas essa pirâmide tem importantes problemas, dos quais muitos cientistas ainda não se deram conta. Veja:
1) A tomada de decisão não depende só da qualidade da evidência, mas também da força da recomendação.
2) O nível da evidência não depende apenas do delineamento, como sugerido pela pirâmide.
3) A qualidade do delineamento não está apenas na sua estrutura previamente estabelecida, mas também na qualidade da execução.
A clássica Pirâmide das Evidências Científicas é excessivamente rígida. Incapaz de capturar toda a dimensão da boa ciência.
Por sua vez, ela conduz a interpretações também engessadas (ou mumificadas, como brinquei no título).
Lembro-me de que, durante a pandemia de covid-19, surgiu uma metanálise feita de estudos com modelo experimental (animais e células) endossando a cloroquina como tratamento para covid-19.
Como ‘metanálises’ estão no topo da pirâmide, muita gente saiu afirmando que se tratava de algo notável. Nada disso! Vamos entender:
1. O que é a Pirâmide de Evidências Científicas?
A Pirâmide das Evidências ordena os tipos de estudos em uma hierarquia de confiabilidade dos diferentes tipos de delineamentos experimentais. Algo como na imagem abaixo.

No topo, situam-se as Revisões Sistemáticas e Metanálises, seguidas pelos Ensaios Clínicos Randomizados (ECR), Coortes, Caso-Controle, Séries de Casos, e Opiniões de Especialistas na base.
NOTA: apesar de sugerido pela Pirâmide, as ‘opiniões de especialistas’ não são consideradas ‘nível de evidência’ (é o que nos alerta o Grading of Recommendations Assessment, Development and Evaluation - GRADE).
Modelos amplamente aceitos, como o sistema GRADE, partem da premissa de que os ECRs (Ensaios Clínicos Randomizados) oferecem, por princípio, o nível máximo de evidência (evidência alta). Mas podem perder relevância (descer na pirâmide).
Por outro lado, os estudos observacionais são classificados inicialmente como de nível baixo de evidência, mas podem ganhar relevância (subir na pirâmide).
O problema é que muitos ainda interpretam a Pirâmide estática.
Ao associar a qualidade da evidência exclusivamente à estrutura a priori do delineamento (o tipo de estudo), ignora-se a possibilidade de, por exemplo, um ECR mal conduzido ou enviesado produzir evidências de baixa qualidade.
Por outro lado, um estudo observacional robusto pode produzir resultados muito impactantes, como fizeram Doll e Hill, em 1956 (daqui a pouco falo desse estudo).
A máxima de que “um ECR está sempre no topo” é perigosa e precisa ser confrontada. Pior ainda é acreditar que uma metanálise está sempre no ápice da pirâmide. Não!!! (voltarei a isso daqui a pouco).
Além disso, um único estudo, mesmo um ECR “perfeito”, não é inquestionável, e não prova causalidade com segurança absoluta.
A confiança na inferência de causa-efeito advém do acúmulo de evidências, especialmente aquelas produzidas por grupos de pesquisa independentes.
2. A Necessidade de Uma Desmumificação: ECR vs. Coorte Bem Conduzida
O julgamento da evidência deve ser dinâmico, permitindo que a classificação de um estudo aumente ou diminua em função do seu rigor metodológico.
Não raramente, um estudo observacional (como uma coorte), quando bem conduzido, pode gerar uma evidência mais robusta que um ECR limitado.
Um exemplo clássico na história da ciência, que gosto sempre de citar, é exatamente o estudo observacional, do tipo Coorte, de Doll e Hill (1956):
Eles investigaram a associação entre tabagismo e câncer de pulmão. O estudo evidenciou um alto gradiente dose-resposta (quanto mais cigarros fumados, maior a mortalidade). Entre os extremos, a chance de morte por câncer de pulmão foi ~ 23 vezes maior para os fumantes.
Uma associação tão expressiva e poderosa como essa, gera uma evidência muito forte, o que, na prática, eleva o seu nível de confiança, a ponto de praticamente não deixar dúvidas sobre a relação causa-efeito.
De fato, a história confirmou os achados de Doll e Hill.
É preciso lembrar que, às vezes, seja por razões éticas ou inviabilidades outras, é impossível conduzir um ECR de longo prazo para testar uma hipótese.
É exatamente o caso de estudos envolvendo cigarros ou várias outras drogas.
Aliás, em 1965, o próprio Hill (Austin Bradford Hill) propôs critérios que devem ser considerados para julgar a força da evidência de estudos observacionais. Já fiz um post sobre isso: Os Critérios de Hill e a Prática Baseada em Evidência.
Metanálises: O Topo Não Sempre é Lugar Delas
As Metanálises e Revisões Sistemáticas são tradicionalmente colocadas no ápice da pirâmide.
Mas é fundamental reconhecer que nem toda Metanálise está no alto da pirâmide, mas sim somente aquelas feitas com estudos robustos.
Uma metanálise inclui estudos de baixa qualidade, ou se ela se baseia em uma amostra de estudos que sofre com diferentes vieses, não pode estar no ápice da pirâmide. Isso seria superestimar a qualidade da evidência.
E pode gerar efeitos devastadores, como ocorreu na pandemia covid-19, quando uma metanálise feita de estudos pré-clínicos navegou rapidamente pela internet, e tomou o mundo de euforia. Por causa desse estudo, houve uma correria insana atrás da cloroquina.
E sabemos que estudos mais rigorosos posteriores mostraram não haver associação entre cloroquina e cura do vírus associado a covid-19.
Assim, a posição da Metanálise na pirâmide deve ser questionada por meio de uma avaliação técnica rigorosa da qualidade dos estudos que a compõem.
3. A Pirâmide Diz Algo Sobre o Nível de Evidência, Mas Não Sobre a Força da Recomendação.
O nível de evidência (qualidade metodológica) e o grau de recomendação (aplicabilidade) são julgamentos distintos.
Nível de Evidência: Julga a confiança no resultado do estudo, baseado em critérios formais do método.
Grau de Recomendação: Reflete a aplicabilidade e a força com que uma conduta é sugerida ou indicada, considerando vários critérios formais.
Para navegar corretamente neste cenário complexo e superar a visão estática da Pirâmide das Evidências, é imperativo que profissionais e estudantes da área da saúde desenvolvam sua emancipação no julgamento de estudos científicos.
Foi para contribuir nisso que escrevi o livro ‘Tomada de Decisão Baseada em Evidência: como julgar o nível de confiança e o grau de recomendação de artigos científicos na área das ciências da saúde'.
O livro oferece um sistema estruturado e didático, com:
Modelo de Julgamento Objetivo: um sistema de notas (0 a 100%) em paralelo a um sistema qualitativo (muito baixo, baixo, moderado, alto e muito alto), que permite julgar a qualidade da evidência objetivamente, mitigando a subjetividade, sem a eliminar.
Separação Estruturada: o livro oferece um framework claro para avaliar o Nível de Evidência com base em 13 quesitos metodológicos, e o Grau de Recomendação com base em 9 critérios formais.
Ferramenta Prática (Checklist/Planilha): O conteúdo está associado a uma planilha que orienta no julgamento da qualidade da evidência e na força da recomendação (ainda serve como checklist).
Para saber mais sobre o livro, clique aqui.
E se quiser ver o uso prático, passo a passo, da aplicação do meu livro, acesse o post: Polilaminina: NÃO há Evidência de Cura de Paraplégicos ou Tetraplégicos
Então é isso, amiga e amigo... Obrigado por ler até aqui. E se você gostou, compartilhe com colegas e amigos/as ou em suas redes sociais. Meus posts são feitos exclusivamente das minhas leituras, práticas e interpretações ao longo da minha trajetória.
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E se quiser citar esse post, pode ser assim:
Lunz, W. A Pirâmide (mumificada) das Evidências Científicas. Ano: 2025. Link: https://www.wellingtonlunz.com.br/post/piramide-das-evidencias-científicas [Acessado em __.__.____].

Autor: Wellington Lunz é o proprietário desse Blog e do site www.wellingtonlunz.com.br. Tem se dedicado em transmitir conhecimentos baseados em evidências em diferentes áreas do conhecimento (ex: hipertrofia muscular, treinamento de força, musculação, fisiologia do exercício, flexibilidade). É bacharel e licenciado em Educação Física, Mestre em Ciência da Nutrição e Doutor em Ciências Fisiológicas. Atualmente é Professor Associado na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Contato pelo site ou e-mail: welunz@gmail.com.br